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Nos dias 9 e 10 de maio, a Escola de Engenharia da UFMG recebeu o I Seminário Internacional de Uso de Lodo de Esgotos em Solo. Durante o evento, promovido pelo INCT ETEs Sustentáveis e ABES-MG, especialista do Brasil e do exterior defenderam o uso de lodo de esgoto em solos. Foram apresentados diversos estudos, que comprovam cientificamente, as vantagens ambientais e econômicas do uso desse resíduo, que pode tornar-se um insumo. Os especialistas questionam o descarte do material em aterros ou outros locais em detrimento do uso seguro e controlado. Além de compartilhar as boas práticas já consolidadas em países como Estados Unidos, Austrália, Nova Zelândia e Reino Unido, o seminário abordou os entraves ao uso de lodo no Brasil e apontaram a necessidade de revisão da norma que regulamenta seu uso no país. Como resultado, o seminário apresentou propostas de modificações da Resolução CONAMA 375/2006.
Na abertura do evento, o coordenador do INCT ETEs Sustentáveis, professor Carlos Augusto Chernicharo, e o presidente da ABES-MG, Rogério Siqueira, deram as boas vindas a todos. O presidente da ABES-MG salientou a importância dos associados e do fortalecimento das instituições para construção de uma sociedade melhor. O professor Carlos Chernicharo destacou que o seminário foi uma construção coletiva que se propôs a apresentar contribuições às normas de uso de lodo de esgoto vigentes no Brasil, sempre tendo em vista as experiências de sucesso praticadas no Brasil e em outros países.
Segundo o especialista em saneamento da Escola de Engenharia da UFMG, Carlos Chernicharo, o objetivo do seminário é consolidar os principais tópicos e propostas para embasar as alterações da Resolução CONAMA 375/2006. “Após a apresentação dos painéis, três grupos serão formados para trabalhar temas estratégicos, posteriormente, as propostas serão levadas ao plenário final onde receberão sugestões e encaminhamentos. O documento aprovado seguirá para apreciação do Conselho Nacional de Meio Ambiente”, concluiu.
O que se observa no Brasil, hoje, é que quase todo o lodo gerado durante o tratamento dos esgotos domésticos vai para os aterros sanitários. Embora seja uma destinação aceita, não é a mais adequada, face aos impactos que podem causar no solo, atmosfera e águas subterrâneas. Outro ponto importante é que se perde o elevado potencial de aproveitamento de seus subprodutos.
O primeiro painel abordou a regulamentação do uso de lodo de esgoto em solos: fundamentação conceitual, abordagem brasileira e panorama internacional. O professor Rafael Kopschitz Xavier Bastos, do Departamento de Engenharia Civil da UFV, fez uma análise crítica comparativa da abordagem brasileira vis-à-vis a experiência internacional (Padrão de qualidade e riscos químicos). Em seguida, o palestrante Michael St John Warne, da University of Queensland, apresentou a regulamentação do uso de lodo de esgoto na Austrália e Nova Zelândia.
O professor Rafael defendeu o marco regulatório como fundamental para incentivar a destinação correta. E, comparando as normas brasileiras e internacionais, com foco em risco a saúde, ele defendeu que o Brasil seja mais flexível em relação ao uso de lodo, permita o uso de lodo classe A e seja menos restritivo em relação ao uso do lodo classe B. “A proposta de revisão da Resolução CONAMA está embasada cientificamente e, desde que respeitada as normas de restrição, podemos ter grandes vantagens com a utilização de lodo de esgoto em solos”, disse. Benefícios que foram ressaltados pelo professor, Jonh Warne, que destacou a riqueza de nutrientes presente no lodo tratado e também aprova sua aplicação no solo.
O segundo painel tratou do uso de lodo de esgoto em solos: benefícios e controle de riscos. O professor do Departamento de Engenharia Sanitária da UFMG, Antônio Teixeira de Matos, citou as potencialidades e limitações do uso de lodo de esgoto em solos – aspectos agronômicos, controle de atratividade de vetores e de impactos ambientais. Ele considera que o grande limitador ao uso do lodo em solos é o tempo determinado pela Resolução CONAMA375/2006 para que a área fique parada após sua aplicação, que varia de 24 a 48 meses. “O uso adequado, respeitando as regras de aplicação, de acordo com o tipo de solo, é mais importante que os possíveis contaminantes que possam estar no lodo tratado”, defendeu.
Em seguida, Tiago Brito Magalhães, do Ministério da Saúde, falou do padrão de qualidade e riscos microbiológicos afirmando que é bastante questionável a proibição do uso de qualquer classe de lodo. Sobre o mesmo tema, a pesquisadora Maria Inês Zanoli Sato, da Cetesb, abordou o decaimento de patógenos em lodo de esgoto. Ela disse que, embora o lodo possa oferecer algum tipo de risco, esses riscos podem ser minimizados. “O ganho do trabalho de análise constantes de patógenos é que eles podem minimizar o cenário de risco e subsidiar as mudanças necessárias na Resolução CONAMA 375/2006”. Por último, a doutora em saúde pública e gerente de controle sanitário da Sabesp, Ana Lúcia Silva, finalizou o painel abordando os Controles operacionais e frequência de monitoramento de qualidade do lodo de esgoto na empresa. “Não podemos ignorar o conhecimento adquirido para adotar o princípio da preocupação e impedir o uso do lodo. Na União Europeia esse uso já está consolidado e precisamos trabalhar com cenários reais. O controle precisa avaliar a sua aplicação ao invés de apenas banir seu uso”, defendeu.
O terceiro painel trouxe a experiência de produtores de lodo de esgoto no uso benéfico em solos. O especialista Stephen Riches, da Anglian Water, apresentou a experiência do Reino Unido, onde 78% do lodo de esgoto é tratado e disposto em solo e os outros 12% incinerados. Ele destacou que 3,6 milhões de toneladas por ano são reciclados para uso agrícola apresentando vantagens como a melhoria da estrutura, qualidade e retenção de água no solo. Em seguida, a agrônoma e mestre em ciência do solo, Simone Bittencourt, da Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), falou da experiência da empresa, que mantém Unidades de Gerenciamento de Lodo (UGL) e destina cerca de 25 mil toneladas/ano de lodo tratado para uso agrícola.
O quarto painel abordou a percepção da sociedade sobre o uso de lodo de esgoto em solos. Para a pesquisadora do CETEC, Marina Andrade, é preciso desmistificar e encontrar soluções para que esse resíduo se torne matéria prima. “Existem muitos ganhos com a utilização do lodo e, embora tenhamos que ter cuidados com os elementos químicos e patológicos e controlá-los, não podemos desconsiderar a grande riqueza de nutrientes que oferece”, destacou. O cafeicultor e engenheiro agrônomo, Milton Cerqueira Pucci, da Associação dos Produtores de Café Especiais da Alta Mogiana (Alta Mogiana Speciality Coffees AMSC) também destacou a importância do uso desse insumo como fertilizante para a cultura do café. “A cidade de Franca, em São Paulo, gera 80 toneladas de lodo diariamente e o excesso de zelo e preconceito estão impedindo os avanços para sua utilização”, criticou. Para o presidente da ONG Ponto Terra, Ronaldo Vasconcellos, apesar das comprovações científicas apresentada pelos especialistas, é preciso considerar e estar preparado para a morosidade do parlamento ambiental Conama. O painel foi encerrado com a apresentação de Cleverson Vitorio Andreoli, da ISAE/FGV que falou das experiências no Paraná e a construção de acordos a nível estadual para viabilizar o uso do lodo em solos como nutriente. “Precisamos avançar e a solução para vencer o preconceito é a informação”, finalizou.
O quinto painel trouxe a visão da regulação internacional sobre o uso de lodo em solos. O engenheiro e professor, Francis de Los Reyes III, da Universidade da Carolina do Norte, destacou que apenas 28% do lodo de esgoto vai para aterros sanitários, o restante é aplicado na terra, sendo que, 11% é transformado em produto classe A e vendido em casas de produtos agrícolas como fertilizante para pomares e jardins. “A Agência de Proteção Ambiental (APA) possui a melhor tecnologia e informação científica disponível e faz uso dela visando sempre a saúde humana e o meio ambiente. As normas que regulamentam a aplicação são revistas a cada dois anos e, até agora, não há evidência de riscos ou problemas causados pelo uso de biosólidos nos EUA”, disse.
O sexto e último painel apresentou a visão dos órgãos governamentais brasileiros sobre o uso de lodo de esgoto em solos. Segundo a pesquisadora Rossana Baldanzi, do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), há 20 anos, o Estado utiliza o lodo na agricultura. As Unidades de Gerenciamento de Lodo (UGLs) tratam o lodo, controlando tanto o que entra nas estações de tratamento de esgotos, quanto adotando todos os parâmetros de controle de patógenos e outros contaminantes definidos pela norma. No Paraná não há utilização de lodo classe B. O representante do Ministério do Meio Ambiente, Lúcio Costa Proença, defendeu a melhoria da gestão dos resíduos orgânicos. “O país precisa de uma alfabetização ecológica para lidar melhor com seus resíduos. As disposições em aterro sanitário devem respeitar a Política Nacional de Resíduos Sólidos, que determina o envio para aterro apenas dos materiais que não tem mais possibilidade de aproveitamento”, defendeu. Para finalizar, Ricardo Gobbo Mendes, do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento mostrou como funciona atualmente o sistema de registro e licenças para uso de produtos derivados de lodo de esgotos. Ele acredita que é preciso buscar a eficiência agronômica com segurança e que a comunidade científica está se organizando para propor as mudanças necessárias.
Após as apresentações, houve debate com a plateia e foi levantada a questão da avaliação dos riscos relacionados à toxicidade aguda e crônica de metais pesados e substâncias orgânicas persistentes no lodo e seu impacto no ambiente, não considerada nos estudos apresentados. Apenas o expositor americano informou que o EPA, Agência Ambiental dos Estados Unidos, realiza estudos e avaliações periódicas neste sentido. Os demais representantes dos outros países, inclusive o Brasil, responderam que não fazem esta avaliação devido ao custo. Em seguida, especialistas se organizaram em grupos para debater as propostas para a Resolução Conama 375/2006. O resultado foi apresentado ao público, recebeu contribuições e será encaminhado para o Conama, que se reúne em 17 de maio para debater o tema.
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